Deuses da Wicca
Muitos Bruxos tradicionalistas insistem em dizer que somente a Deusa
da Lua e o Deus de Chifres podem ser cultuados na Wicca, pois Gardner
idealizou a Arte como sendo uma religião duoteísta. Wiccanianos no mundo
inteiro discutem até hoje se a Wicca é politeísta, duoteísta, monoteísta,
panenteísta ou henoteísta. É tanto "teísmo" que talvez esteja
na hora de fazermos um Concílio, como os de Nicéia e Constantinopla, para
fundamentarmos as “únicas” e “verdadeiras” verdades de nossa religião. Da
maneira como estas pessoas falam, parece que nem Gardner ou Doreen
Valiente eram Wiccanianos autênticos pois eles próprios mencionaram
divindades de panteões variadíssimos na Carga da Deusa original, que faz
referências a Deusas de diferentes panteões como Ártemis, Astarte, Dione,
Melusina, Ceridwen, Dana, Ísis e tantas outras. Ironias à parte, para
mim, esse tipo de afirmação é pura falta de bom senso, preconceito e
xenofobia barata. Se não se concorda com o culto à Deusas africanas na
Wicca, por exemplo, devemos começar excluindo Ísis da lista de Deusas
celebradas, pois até onde eu sei o Egito fica na África!!!Porque Ísis
pode ser cultuada e Mawu não, por exemplo? Por qual motivo se uma é tão
africana quanto a outra? Concordo com as alegações de muitos de que
atualmente as pessoas fazem qualquer mistura e chamam isso de Wicca, mas
não dá para generalizar dizendo que aqueles que são ecléticos em sua
prática, experimentando o trabalho com Deusas e Deuses de diferentes
panteões, não são Wiccanianos! Tal tipo de afirmação é tão absurda ou
equivocada quanto dizer que todos os alemães são nazistas. Os Deuses da
Wicca são simplesmente A DEUSA e oDEUS, o princípio do Sagrado Feminino e
do Sagrado Masculino, que semanifestaram em diferentes culturas com
diferentes nomes. A realidade é que atualmente Bruxos em todo mundo
celebram Deuses de diferentes panteões e os percebem como manifestações da
Deusa e do Deus como um todo. Cada Tradição cultua um casal divino em
particular ou um panteão específico. Algumas Tradições, inclusive,
cultuam Deuses de diferentes panteões indistintamente a cada ritual. O
ecletismo, no sentido de mistura de panteões, sempre existiu. É sabido
que gregos e romanos assimilavam os Deuses da cultura que dominavam, e a
cultura subjugada associava os Deuses de seu dominador. Os egípcios, por
exemplo, sofreram uma forte romanização em muitos aspectos de sua cultura
e religião até serem extintos por completo. Ísis é chamada de a Deusa
Universal por causa de seu culto ter chegado a lugares tão distantes como
Roma ou Portugal. Ísis teve seu culto ligado a Serápis, Diana, Io,
Deméter e muitos outros Deuses. Tacitus, em sua obra chamada "Germanicus", relata que
uma tribo escandinava chamada Rus
cultuava Ísis. Até mesmo Ganga, a Deusa do Rio Ganges teve seu culto
associado ao de Ísis em algum momento na história. O Papiro Oxyrhynchus, que menciona os
nomes e atributos de Ísis em outros países, sugere que ela foi governante
do Ganges. Quando Alexandre, o Grande, invadiu partes da Índia deixou
reis gregos como responsáveis pelos territórios que foram conquistados.
Isso impulsionou, obviamente, a mescla de arquitetura, arte e religião. Como
resultado disso, surgiu a arte greco-indiana em Gandhara, onde se criou
muitas das convenções artísticas encontradas até hoje nas representações
dos Deuses indianos. Ísis influenciou a iconografia de diversas Deusas.
Até Kuan Yin passou a ser representada anos depois com o Nó Tyet, o nó de
Ísis, amarrado em sua vestimenta. Os antigos Deuses da Índia sofreram
alterações marcantes em suas características em decorrência da invasão
ariana. Um exemplo claro disso é a própria Deusa Kali, uma Deusa tão
antiga cujo culto está na cultura matriarcal da antiga Índia. Sua pele
negra demonstra que ela pré-data a invasão ariana (de pele clara), no
continente indiano. O conflito entre os invasores e a cultura original
indiana pode se rastreado nos próprios mitos de Kali. Em muitos mitos
Kali se esforça para defender seu povo contra os invasores (monstros,
pragas, pestes, guerreiros, etc). Os invasores arianos introduziram a
cultura dos Deuses patriarcais, muitos de pele clara, na Índia. Mas Kali
continuou a ser cultuada e retratada como a Mãe Negra por várias tribos
que ainda guardam traços do matriarcado em sua cultura, como os Shabara de Orissa .
Arquétipo é a terminologia usada por Jung para "designar o conjunto de imagens psíquicas do
inconsciente coletivo que são patrimônio comum de toda ahumanidade".
Encontramos semelhanças mitológicas e fisionômicas entre o Cernunnos
celta e o Shiva hindu, assim como entre os caracteres rupestres de
caçadores nas paredes das cavernas dos sítios arqueológicos de
Trois-Frères a da Serra da Capivara, no Piauí - Brasil. Os arquétipos são
padrões de caráter universal originários do inconsciente coletivo e que
constituem o alicerce da mitologia, religião, lenda e contos de fadas de
todos os povos. Apesar do arquétipo aproximar duas divindades de panteões
distintos não faz delas a mesma deidade, no sentido estrito da palavra. O
conceito de "Todas as Deusas são
uma só Deusa e todos os Deuses são um só Deus" foi primeiro
desenvolvido por Dion Fortune, fundadora da Sociedade da Luz Interior (Inner Light), e depois explorado e
ampliado ao redor do mundo através da perspectiva Wiccaniana. No entanto,
esse conceito não expressa a noção de arquétipo. Os arquétipos são
motivos primordiais, não expressam imagens ou motivos mitológicos
definidos. O arquétipo impulsiona a tendência em formar tais
representações que podem variar em detalhes, de cultura para cultura, de
indivíduo para indivíduo, sem perder sua configuração original, simples e
descomplexa. A semelhança de Cernunnos e Shiva expressa o arquétipo do
Deus de Chifres e Caçador, não a individuação da Divindade. É comumente
aceito que não existe autoridade central na Wicca. Se não existe
autoridade central, também não existem leis ou regras que digam que
Wiccanianos não possam celebrar Deuses de variados panteões, observadas a
coerência e compatibilidade em todo esse processo. Logo, isso é tema que
interessa somente a cada praticante, Coven e Grove de acordo com suas
diretrizes internas. Os Deuses que alguém celebra é tema que importa
somente a pessoa envolvida na questão. Pensando abrangentemente, temos
tanto direito de cultuar um Deus hindu, uma deidade Celta ou um Deus
mediterrâneo quanto as pessoas que carregam a ancestralidade dos povos
que cultuaram ou ainda cultuam esses Deuses pois todos andamos sobre a
mesma Terra, nascemos da mesma Mãe: a Deusa. Quando cultuamos Deuses
indígenas ou africanos na Wicca, por exemplo, isto não quer dizer que os
celebraremos exatamente como estas culturas o fazem, mas que usaremos
apenas o arquétipo daquela Deidade para nos conectarmos com um tema
universal seja ele o amor, a proteção ou sabedoria. O ritual realizado
àquela divindade na Wicca não será indígena ou africano. Tais Deuses
serão cultuados à maneira Wiccaniana, usando-se apenas o seu arquétipo e
nome como fonte de inspiração e força para despertar uma energia e
consciência única. Alguns podem dizer que isso não é suficiente para
justificar o culto aos Deuses de diferentes culturas na Wicca e dar
muitas outras explicações do porque isso não deve ser feito baseadas em
territórios geográficos estabelecidos pelo homem, que ao meu ver só
enfraquecem tanto o Paganismo quanto a luta que hoje travamos para
construir pontes entre o que nos separa. Eu digo que não há fronteiras
para o Sagrado e o chamado para servir uma Deidade deste ou daquele
Panteão pode surpreender qualquer um de nós nos momentos mais inesperados
de nossas vidas. Somos cidadãos do mundo, filhos da mesma Mãe Terra e
como tal temos direito de cultuar os Deuses e Deusas com os quais nos
sentimos mais próximos ou aqueles que nos chamam para servi-los. Somos um
Planeta, um só Povo, uma só raça: a raça humana!
(Autoria:
Claudiney Prieto)
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